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Advogada aponta “pacto” do governo por “Kit covid’ em depoimento na CPI

A advogada Bruna Morato, representante de médicos que denunciam a rede Prevent Senior por fraudes na pandemia, acusou nesta terça-feira o governo Jair Bolsonaro de firmar um “pacto” com a operadora de saúde para validar o tratamento da covid com medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença – o chamado “kit covid”. O objetivo, segundo ela, era usar um estudo realizado em hospitais da rede para confirmar o discurso do Palácio do Planalto contrário ao isolamento social e ao lockdown, adotados como forma de evitar a propagação do vírus.

Em depoimento de mais de seis horas à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, Morato disse que a estratégia estava alinhada com interesses do Ministério da Economia e era intermediada por integrantes do “gabinete paralelo”, formado por médicos defensores do chamado “tratamento precoce”, que prestou assessoria informal a Bolsonaro durante a pandemia. A advogada citou como integrantes do grupo a oncologista Nise Yamaguchi, o virologista Paolo Zanotto e o toxicologista Anthony Wong, que morreu de covid num hospital da rede, mas teve a informação omitida da declaração de óbito.

Bolsonaro chegou a divulgar em suas redes sociais informações sobre o suposto estudo com o “kit covid”. O alinhamento da Prevent Senior com o governo, de acordo com Morato, começou no ano passado, após críticas do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta à subnotificação de mortes de pacientes e ao atendimento da operadora a idosos. Ela relatou que o diretor executivo da empresa, Pedro Benedito Batista Júnior, tentou “se aproximar do Ministério da Saúde”, mas não conseguiu.

“Ele tentou se aproximar, então, de supostos assessores que estariam orientando o governo federal. Esses assessores estariam alinhados com os interesses do Ministério da Economia”, disse a advogada. Questionada por senadores sobre quais integrantes da pasta conversaram com a Prevent Senior, Morato afirmou que não tinha a informação. “Em nenhum momento eu recebi informação que descrevesse nome ou participação dessas pessoas.”

A advogada declarou que os relatos recebidos pelos médicos eram de “um interesse” da Economia para que o País não parasse e que, se houvesse lockdown, haveria uma grande perda econômica. “O que eles (médicos) me explicaram foi o seguinte: existe um interesse do Ministério da Economia para que o País não pare. Se nós entrarmos nesse sistema de lockdown, nós teremos um abalo econômico muito grande. Então, existia um plano para que as pessoas pudessem sair às ruas sem medo”, disse Morato.

“O que eles tinham que fazer era conceder esperança para que as pessoas saíssem às ruas, e essa esperança tinha um nome: hidroxicloroquina”, completou, citando um dos medicamentos do “kit covid”. “A Prevent Senior entra para corroborar essa possibilidade, ou seja, a possibilidade de as pessoas se exporem mais ao vírus cientes de que existe uma possível cura ou um possível tratamento”, afirmou Morato.

A Prevent Senior se tornou alvo da CPI após um grupo de 15 médicos que atuaram na operadora entregar um dossiê aos parlamentares em que acusam a rede de servir como uma espécie de “laboratório” do “kit covid”. Segundo a denúncia, pacientes não eram informados sobre o tratamento e atestados de óbitos eram fraudados para omitir que a morte foi causada pela doença. A empresa nega as acusações e se diz alvo de difamação (mais informações nesta página).

Denúncias

No seu depoimento, Morato relatou aos senadores que médicos e enfermeiros da Prevent Senior chegaram a trabalhar infectados pelo coronavírus por causa da “escassez do corpo clínico” da empresa. Ela apontou também que os profissionais de saúde da rede não tinham autonomia e a operadora demitia quem não receitava o “kit covid”. “Os médicos eram, sim, orientados à prescrição do kit. E esse kit vinha num pacote fechado e lacrado, não existia autonomia até com relação à retirada de itens desse kit”, afirmou. “Quando o médico queria tirar algum kit, ainda que ele riscasse na receita, o paciente o recebia completo.”

De acordo com a advogada, a insistência da rede com esses remédios ocorreu como parte de uma estratégia para redução de custos. A representante dos médicos disse ter encaminhado à CPI mensagens de texto de integrantes da empresa que, segundo ela, “mostram que a Prevent Senior não tinha a quantidade de leitos necessários de UTI e que, por isso, orientava que fosse feito o tratamento precoce”. A média de idade dos associados da operadora, segundo a advogada, é de 68 anos.

“É muito mais barato para a operadora disponibilizar determinados medicamentos do que fazer a internação”, afirmou. De acordo com a advogada, ela ouviu relatos de que, em outras situações, após um período de internação de mais de 14 dias, pacientes eram submetidos a um protocolo de tratamento paliativo, que incluía a redução da oxigenação. Essa denúncia, no entanto, não consta no dossiê entregue à CPI e Morato disse ser preciso averiguar. “A expressão que eu ouvi ser muitas vezes utilizada é ‘óbito também é alta’.”

Reação

Os relatos da advogada levaram os senadores a pedir que o Conselho Federal de Medicina, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo e a Agência Nacional de Saúde Suplementar, vinculada ao Ministério da Saúde, sejam investigados pela Procuradoria da República e pela Polícia Federal por suposta omissão.

O pacto com o governo, segundo Morato, deu “segurança” à Prevent Senior de que a rede “não sofreria fiscalização do Ministério da Saúde ou de órgãos vinculados” à pasta. “Estamos assistindo a um escândalo macabro com sinais tristes de eugenia. Algo que revela o quanto é triste esta página da história que nós estamos vivendo”, disse o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), ao fim do depoimento.

Fonte: Correio do Povo


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